sexta-feira, 23 de setembro de 2011

1823




Foi no ano de 1823, quando um filho do sol, de cabelos de ouro e olhos de mar, se deparou com uma cena surpreendente: um capitão-do-mato, cavalgando pela estrada.
Via-se ser de pouquíssimos amigos, semblante fechado, olhos duros; sentia-se o seu suor forte; viam-se seus calçados sujos.
Contudo, uma coisa era certa: que presença tinha.
Sua presença amedrontava a quem o cruzasse pela estrada, abrindo, assim, caminho entre quaisquer transeuntes desavisados.
Quando o alemão conseguiu desgrudar os seus belos olhos daquele Negro, pôde reparar em sua montaria e, pelo inferno, tamanho foi o seu choque: o Negro ostentava um negrino desgraçado como cavalo.
Nossa! Que visão!
O coração de Rugendas quase escapava-lhe pela boca e seu olhar encontrou o do Capitão, que lhe lançou um sorriso de escárnio. Apontou uma direção e Rugendas compreendeu que deveria segui-lo.
O escravo, nu, de quatro, levava o seu Capitão. Mudo de dor.
Cego de amor!
Feliz por servir àquele deus.
Nada mais importava no mundo, desde que seu corpo foi o assento daquela criatura, desde que seu ser o pudesse adorar. É verdade que foi arrancado do seio familiar, que já não exercia a sua autoridade em sua tribo...Porém, é verdade que ele oferecia cânticos de louvor a Providência pela oportunidade de ser feliz!
Que força era aquela?
De onde via o poder daquele Negro?
Passada uma hora de caminhada, surge uma senzala. O Negro ordena que o seu cavalo pare para que ele desça. Assim foi feito.
A primeira manifestação de "humanidade" apareceu, quando o Capitão deu de beber ao seu cavalo que tremia de dor e excitação: seus joelhos e suas mãos estavam em carne viva.
Mas essa tímida manifestação logo se dissipou e o Negro punha o negro amarrado dentro próximo à entrada da senzala.
Ao receber o convite mudo, Rugendas adentrou a senzala.
Foi incapaz de conter o assombro diante da cena.
Dentro daquele lugar parca e porcamente iluminado, estavam cerca de 13 negrinhos.
O piru do alemão vibrou. Mas o seu cu piscou tão intensamente que parecia que iria se desprender do corpo e se juntar aos prisioneiros.
Usando todo o auto-controle que conseguiu reunir, permaneceu quieto, apenas observando o Negro-mor.
Viu-o despir-se calmamente.
Que nudez!
Quando os 13 servos presenciaram aquela imagem divinal, começaram a cantar em voz alta.
Alucinados ficaram.
Foram soltos.
Estavam em frênesi aterrorizador. Subitamente, um vento quente invadiu o local e os negros começaram a gingar, e, em coro, cantar numa língua mística.
Rugendes estava hipnotizado, jamais vira algo parecido.
Enquanto tudo vibrava em torno, o Negro segurava firme o seu cajado. De tempos em tempos um servo vinha chupar a sua pica, deixando-a babada. E os louvores a Exu se intensificando...
Exu materializado.
A divindade sensual, lasciva, obscena estendia sobre todos os seu poder; e divertia-se com aquela festa.
Jamais se ouviu sobre uma reunião como aquela.
Todos se comendo, todos se lambendo.
Um carrosel humano, de negros, lindos, pirocudos, ligados, apenas por suas picas.
O alemão, trêmulo, babava. Seu desejo maior era ser negro. Filho da África.
Amaldiçoou seu continente, seu país frio, sua pele branca. Daria tudo para ser capacho daqueles homens.
Chegou um momento em que não era possível saber onde os corpos começavam ou terminavam. Todos suados, babando.
O cheiro de merda e de mijo reinando no ar. Todos os paus esfolados. Todas as bundas mordidas, arrombadas. Todos os corpos manchados de merda mergulhada em porra.
Os Orixás aceitaram o ritual estranho.
Eis a hora do sacrifício.
A um gesto de Exu, Rugendas fica de quatro e põe-se a lamber a todos os 13 negros, limpando-os do suor e do sexo. Sua lingua quase sai do corpo enquanto lambia os pés dos negros, de tanta sujeira, de tão grossos.
Foi a primeira vez que conheceu prazer!
Quando terminou, Exu convocou os lacaios e, todos, pisotearam aquele intruso imundo.
Os ossos daquele homem estalando, quebravam sob aqueles demônios, enquanto a sua vida se esvaia.
Exu subiu, quando a sua missão terminara.
Todos os demais amarraram-se novamente e mutuamente e esperaram a próxima alimentação.

Nenhum comentário:

Postar um comentário